sábado, 28 de agosto de 2010

Um dia cotidiano de um jovem universitário

Já eram 06h45, eu estava atrasado. Levantei correndo, troquei de roupa, lavei meu rosto e saí de casa apressadamente. Mochila nas costas, em uma mão o guarda-chuva e em outra o sanduíche preparado na noite anterior. Eu precisava chegar em menos de cinco minutos na parada de ônibus, senão teria de esperar o próximo, que passava somente às 07h15, o que deixaria meu chefe nada feliz. Foi o que aconteceu.

Enquanto esperava a condução, pensava em uma desculpa convincente para explicar o meu atraso. Um atraso enorme, diga-se de passagem.

“Senhor, estava eu no ponto de ônibus e não é que um desgraçado passou muito rápido por uma poça d’água e toda ela veio na minha direção? Tive que voltar em casa, tomar um novo banho e mudar de roupa.” Não, essa é muito clichê. E se eu disser que minha mãezinha passou mal de última hora e eu precisei acudi-la? Também não. Achei melhor contar-lhe a verdade.

Chegando na redação, meu chefe já estava a minha espera, olhando-me fixamente com aquela cara de “Espero que você tenha uma boa explicação para o seu atraso”, e foi exatamente o que ele disse.

- Sabe o que é, Seu Garcia... Ontem, cheguei muito tarde da aula e precisava fazer um trabalho pra hoje, pois durante o dia eu trabalho pro senhor, aí acabei dormindo tarde demais...

- E aí você acordou em cima da hora. Tudo bem, ao menos me diga que você terminou aquela matéria. Respondeu meu chefe.

- Pois então... Como eu disse, cheguei tarde e precisei fazer esse trabalho, que vale uma nota bem alta, Seu Garcia!

- Então você não terminou a matéria?

- Não, mas eu faço isso pra já, pode deixar!

- Rapaz, você só me causa problemas... Vai, vai, vai logo e vê se não se atrasa mais, hein? Estou de olho em você!

Geralmente, Seu Garcia descontava os atrasos do meu salário. Naquele dia, ele estava de bom humor. Que sorte a minha.

Entre outras coisas que tive que fazer, terminei a matéria em cima da hora e confesso que não estava tão boa assim. Tudo culpa da pressa. Seu Garcia me mataria no dia seguinte, mas essa é uma outra história.

Saí da redação satisfeito por ter cumprido, apesar dos contratempos, mais um dia de trabalho.

A satisfação foi embora logo que saí do prédio. Chovia e ventava muito em Porto Alegre. Fui para a estação de trem e embarquei rumo a São Leopoldo. De lá, peguei mais um ônibus até a Unisinos e cheguei na Universidade por volta de 19h15. Fazia muito frio e, por conta da pressa pela manhã, esqueci de levar um casaco. Menos um ponto para mim.

Quando estava entrando na sala de aula, lembrei: “Meu Deus, o trabalho!!!”

Saí tão atordoado de casa pela manhã, que esqueci o maldito trabalho que fiquei madrugada adentro fazendo. Naquele momento, quis me afogar no laguinho da Unisinos.

O próximo passo era explicar a situação para o professor e pedir uma nova data de entrega. Quase fiquei de joelhos diante de toda a turma, mas consegui convencê-lo. Que fique bem claro: nem sempre isso funciona. A minha sorte (se é que pode se dizer que tive alguma sorte naquele dia) foi que o professor não era “linha-dura”.

A aula, que me desculpe ele, estava uma droga. Semiótica era uma disciplina que agradava a poucos, e eu, definitivamente, não fazia parte dessa parcela.

20h45: intervalo! Seriam os 15 minutos mais proveitosos do meu dia. Iria para a Fratello, comeria decentemente e beberia um delicioso chocolate quente para me esquentar. Iria, beberia, comeria. Futuro do pretérito, conhece? “O futuro do pretérito costuma ser relacionado às noções de hipótese, incerteza e irrealidade.” Pois é. Saindo da sala, minha namorada me ligou: “O que aconteceu? Você me disse ontem que teria um tempo livre pra me ver hoje. Se aconteceu um imprevisto, não tem problema. Mas custa me avisar, Victor? Deixei de fazer várias coisas por sua causa!” Resultado: Gastei meus preciosos 15 minutos tentando explicar a ela o caos que foi meu dia. Quando disse que diante de tantos problemas o nosso encontro nem me passou pela cabeça, ela desligou na minha cara.

É, Victor... Menos um ponto pra você.

A segunda metade da aula foi usada para apresentações de trabalhos, então eu não senti culpa alguma em pegar meu celular, sintonizar na Rádio Gaúcha e escutar o jogo do meu time do coração. Como eu não podia perder a moral com o professor, que me cedeu um novo prazo valioso de entrega, fui o aluno mais concentrado e me abstive do primeiro tempo do jogo.

15 minutos da etapa complementar, o Inter está perdendo por 2x0 e está, com esse resultado, sendo eliminado da Libertadores pelo Estudiantes de La Plata!”

Naquele dia, descobri que, por mais que as coisas estivessem ruins, elas sempre podiam ficar piores. Precisávamos de somente um gol e estaríamos classificados para as semifinais!

Esqueci minha namorada, esqueci tudo que deu errado no meu dia e me concentrei no jogo.

Quando tudo parecia perdido, aos 43 minutos do segundo tempo, Giuliano chegou livre pela direita e descontou o placar do jogo com um chute cruzado. Era o gol da classificação. Naquele momento, sem pensar, saltei da cadeira e comemorei como nunca. O professor me olhou com uma cara tão feia, que com certeza eu sentirei medo até o resto dos meus dias. Rapidamente, tirei o fone dos ouvidos e voltei a prestar atenção na aula, como se nada tivesse acontecido.

O jogo foi realmente a única alegria do meu dia. Ao acabar a aula, lembrei que eu tinha que ir até a Estação Unisinos, depois até a estação de trem de Porto Alegre e pegar mais dois ônibus até minha casa. Cheguei à 1h da manhã e totalmente esgotado. No dia seguinte, teria que me redimir com a minha namorada, levar mais uma bronca do seu Garcia e, de algum jeito, arranjar tempo de ir mais cedo à universidade para entregar aquele trabalho. É, vida de universitário não é fácil. Deitei a cabeça no travesseiro e dormi.

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